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sábado, 4 de agosto de 2012


OBSERVAÇÕES SOBRE
CALLIANDRA DEPAUPERATA
Nome popular: Carqueja


Texto: Galdino

O PRIMEIRO CONTATO – A Calliandra Depauperata (Carqueja) surgiu na minha atividade como bonsaísta por acaso. Em uma visita a um terreno de um amigo, em uma área que estava em processo de loteamento, deparei-me com uma planta que estava rebrotando depois da passagem das máquinas fazendo o desmatamento. Logo me chamou a atenção o vigor daquela planta e a rapidez como brotava depois do desmatamento.



Ali naquela área existiam várias outras espécies, como jurema preta, jurema de imbira, imburana, marmeleiro, pereiro, catingueira, camará, além de outras. Fiquei impressionado ao observar que aquela planta, que desconhecia completamente, era a primeira a rebrotar e formar uma bonita copa. Procurei informações com moradores da área mas eles não souberam informar o nome daquela planta. Mesmo assim, fiquei encantado e não resisti: coletei no final do mês de setembro de 2009 três exemplares naquele terreno muito argiloso e com grande quantidade de pedras.


Só alguns meses depois, com a ajuda de outros bonsaístas, como Sergivaldo Costa e Rock Jr., foi que consegui identificar aquela espécie. Mesmo que até hoje não tivesse identificado, com certeza estaria cultivando a Calliandra Depauperata, pois ela, quando em plena brotação, chama a atenção de qualquer bonsaísta que a veja. Impossível que ela passe despercebida. E se estiver coberta de flores, aí sim, a beleza é exuberante.




A ESTRUTURA – O tronco da Calliandra Depauperata tem aparência envelhecida e, dependendo das condições em que se desenvolveu, toma formas retorcidas, dando logo a impressão de árvore centenária, apesar de ser um arbusto.



Cheguei a encontrar a Calliandra Depauperata com altura que atinge entre 3,5m e 4,0m. Ela ganha mais altura quando fica sufocada entre outras árvores maiores. Em campo mais aberto, ela se mantém em uma altura que varia entre 50cm e 2,0m. Em terrenos mais áridos, sobretudo rochosos, é comum encontrar Calliandra Depauperata com idade avançada, estimada acima dos 20 anos, com altura que não passa dos 30 centímetros. Um bonsai natural.




A copa é bastante densa, com grande quantidade de galhos repletos de pequenas folhas, menores do que folhas de outras variedades de calliandra, como a Selloi ou Spinosa. A sua flor é bastante pequena, na cor vermelha.



Para compensar o diminuto tamanho, a florada é bastante intensa e sua copa fica coberta de um vermelho vivo contrastando com o verde intenso de sua folhagem.

COMPORTAMENTO – Observei que mesmo na natureza acontece de algum galho dela vir a morrer, provavelmente pelo apodrecimento da raiz, ou grupo de raízes responsável por alimentar aquele setor da planta. A raiz pode apodrecer pela ação do homem ou mesmo pela investida de algum animal de pequeno ou grande porte. Encontrei várias que em seu tronco havia buracos cavados por peba, animal que escava terrenos em busca de tubérculos para se alimentar. Durante coletas que realizei, observei que entre as raízes de várias Calliandras existia uma pequena batata de uma planta que provavelmente serve de alimento para os pebas. Nesse processo de escavação, ele pode danificar algumas raízes e assim comprometer a sobrevivência de alguns galhos. Essa foi a minha primeira observação sobre a perda de galhos. Depois, já com a planta em casa, observei que o fenômeno da perda de galhos acontece eventualmente e até hoje não consegui identificar uma causa exata para que assim aconteça. Em uma das vezes notei que a perda se deu em função de eu ter feito transplante, com poda de raiz e aérea, em época não apropriada. Tomei todas as precauções, mas mesmo assim perdi um galho. Mas o incrível dessa planta é que mesmo um galho morto traz beleza a ela. O importante é quando for fazer o transplante ficar bastante atento às estruturas de raiz e ter certeza que existem raízes finas ligadas a todas as raízes grossas. Assim fica mais fácil que o alimento chegue a todos os galhos da planta, evitando assim a perda de algum deles.

ALIMENTAÇÃO – Durante o tempo que cultivo Calliandra Depauperata como bonsai, notei que as raízes finas, aquelas que alimentam, se desenvolvem em grande quantidade quando a planta é colocada em bacias usando inicialmente como substrato apenas areia lavada e preservando parte do torrão vindo na coleta. Em pouco tempo você tem raízes suficientes para manter a planta bem saudável. A quantidade de raízes funcionais é tão grande, que quando for realizar o transplante para um vaso pode-se reduzir as raízes pela metade. Claro que aí temos também que fazer a poda aérea. Em aproximadamente 10 dias ela começa o processo de rebrotação para formar uma nova copa. Uma vez levada para o vaso, é essencial o uso de matéria orgânica no substrato. A Calliandra Depauperata, assim como o Juazeiro, gosta de solos ricos de matéria orgânica. No seu habitat natural, anualmente há uma queda de grande quantidade de folhas que se decompõem e lhe servem de alimento. Só a título de observação, tenho um exemplar de grande porte (refiro-me à circunferência do tronco, e não à altura) que mantenho em vaso há quase 3 anos e que vem se comportando muito bem em um substrato pouco drenado, com bastante argila. Portanto, se optar por usar um substrato pobre em matéria orgânica, bem drenado, é melhor ficar atento para alimentá-la com fertilizantes que contenham os elementos básicos para seu desenvolvimento (NPK), além dos micronutrientes. Uma boa opção, nesse caso, é usar o Osmocote, que tem liberação gradual de nutrientes e não precisa que o bonsaísta esteja sempre atento a fertilizações constantes. Tenho feito a variação entre as duas formas de alimentá-las  e venho obtendo ótimos resultados.

MULTIPLICAÇÃO – A Calliandra Depauperata pode ser multiplicada usando-se sementes, alporque ou estaca. O plantio de sementes pode ser feito em qualquer época do ano. Até o momento tenho conseguido em torno de 50% de germinação das sementes que planto. Esse baixo poder de germinação acontece devido a alguns fatores. Um deles é a semente atacada por uma broca que se instala na vagem antes mesmo que ela seque e perfura a semente antes da maturação. Outro fator é devido ao pouco desenvolvimento de algumas sementes na vagem. Assim algumas sementes ficam menores que outras, e essas menores em geral não têm bom poder de germinação.  Já o processo de multiplicação por alporquia ou estaquia mostra melhores resultados quando feito entre os meses de outubro e dezembro.

YAMADORI – Inicialmente gostaria de tranqüilizar todos aqueles preocupados com a preservação da espécie no seu ambiente natural, e aqui me incluo. É que a Calliandra Depauperata tem uma característica própria que difere de algumas outras espécies no que se relaciona à sua estrutura de raízes. A sua malha de raízes se desenvolve de forma mais acentuada na horizontal, buscando alimento em áreas superficiais. A sua raiz principal, a pivotante, não alcança grande profundidade, e as demais, grossas, servem como apoio horizontalmente, como falei anteriormente.



Assim, o processo de coleta é bastante facilitado e as raízes que são cortadas na coleta ficam no solo e rebrotam. Assim, tiramos uma planta e em breve teremos no mesmo local uma grande quantidade de plantas que brotaram das raízes que ficaram fincadas no chão. Isso tenho observado porque sempre volto aos locais onde fiz yamadori e vejo a grande quantidade de novas brotações que surgem no local onde foi coletada a planta. Vendo por essa ótica, quando coletamos Calliandra Depauperata estamos multiplicando a quantidade de exemplares na natureza. Não quero aqui estimular a coleta desenfreada desta espécie. Antes de tirar uma planta do chão, é bom observar atentamente se ela realmente serve aos nossos objetivos. Se não for um bom exemplar para bonsai, melhor deixá-la ali mesmo.



Agora vamos à forma como coleto a Calliandra Depauperata.  Levo comigo as ferramentas básicas como chibanca, facão, tesourão, tesoura menor, plástico para acondicionamento, fita adesiva ou ligas para embalagem e... água. Sim. Levo água em garrafas pet, pois antes de começar o trabalho de escavação vou molhando ao redor da planta, para permitir que o torrão fique mais consistente. Enquanto a água é absorvida pelo solo, uso o tesourão para podar os galhos grossos, deixando a estrutura da planta na forma desejada. Depois de molhado o entorno do tronco da planta, vou cavando ao redor, cortando as raízes. Dependendo do porte da Calliandra, utilizo a chibanca ou simplesmente o facão. Quando a planta a ser coletada é de pequeno porte, enterro o facão na vertical e puxo cortando as raízes. Faço isso nos quatro lados da planta e logo todas as raízes horizontais estão contadas e o torrão fica retangular. Depois é só cortar alguma raiz que esteja mais profunda, o que é raro, e tirar o bloco do tronco com o torrão bem formado, pois a humidade ajuda. Aí é só envolver em plástico e a planta está pronta para transporte. No retorno para casa, é só colocar em bacia ou caixote com areia lavada (areia de construção) e em aproximadamente 10 dias ela já mostra brotação.



Em outras espécies de plantas o processo de coleta é bem mais trabalhoso, pois em geral as raízes grossas vão a grandes profundidades e as raízes funcionais, as finas, não estão rasas. Nesse caso a planta sofre um estresse bem maior e, dependendo da espécie, a recuperação é demorada.
É bom que se tenha o cuidado de logo após acomodar a planta fazer uma cuidadosa  pulverização com algum tipo de inseticida para matar alguma praga que eventualmente venha na planta, como cupins, formigas ou outros insetos. Uso aquele chamado de Barrage, que é eficiente e barato e pode ser encontrado em qualquer pet shop ou loja de material veterinário. Esse procedimento evita trazer para casa pragas que podem se espalhar por outros bonsai que tivermos.

ARAMAÇÃO – Quanto à estruturação e condução da copa, tenho obtido melhores resultados fazendo tracionamento dos galhos lignificados, ou seja, que já adquiriram estrutura de madeira. Para aramar, melhor fazê-lo enquanto os galhos ainda estão bem finos, entre 2 e 3mm, pois logo a madeira se torna áspera e fácil de quebrar. Em aproximadamente 4 meses os arames podem ser retirados, dependendo da espessura do galho e curvatura que se deseja obter.
Mas, grande parte do trabalho de formação da copa da Calliandra Depauperata pode ser feito usando constantemente a poda de galhos para adensamento e estruturação da copa.


Bem, essas são as observações que tenho feito sobre a Calliandra Depauperata nesses anos de contato com ela. Faço observações em casa, com elas bem alimentadas, mas rotineiramente estou indo ao campo em companhia de alguns amigos bonsaístas e venho observando o seu comportamento na natureza em todas as estações do ano.
Espero ter ajudado aos que buscam informações sobre essa variedade de calliandra.